domingo, 5 de dezembro de 2010

Ei coraçao

Coração,
Senta aqui. Acalme-te, pare de pular só um pouquinho, não é brincadeira, é sério; doído, sofrido, amargo, gelado, feio. Não faça esse bico de choro, não vou jogar toda a culpa em suas costas cansadas, não quero lhe cobrar nada e nem pedir que se sacrifique. Porém venho sim, mais uma vez, dar-te um conselho; calme, calme, não vou te exigir nada, mas precisamos conversar. Sei que eu mesma já vim várias vezes cobrar-te mais razão, maior bom-senso e mais um bocado dessas outras coisas frias, só que agora, coração, eu venho pedir-te, não, não, implorar-te para que pare!
Ah, querido, as coisas não são assim – como eu achei. Eu sei, eu sei, fui eu quem pediu, mas me escute: lembra-te como eu era, coração? Lembras? Eu era assim como tu: doce, leve, ingênua, eu acreditava tanto nas pessoas, acreditava mesmo; só que aí coração, não sei o que aconteceu comigo, fui tomada pela razão, possuída por uma frieza desconhecida. E olhe, eu juro, odeio jurar, mas juro sim que eu tentei resistir, fiz de tudo, mas não teve jeito, ela me dominou. E então, coração, eu falei todas aquelas coisas horríveis para ti, cobrei-te o que tu não podias dar e que, no fundo, nem eu mesma queria que fizesses; mas tu sabes, eu me arrependi, arrependi muito, porque eu gosto de ti. E é por gostar de ti e ter aprendido a gostar de mim também que eu estou aqui, amigo, quero teu bem, nosso bem.
Preste atenção, não se distraia, concentre-se bem no que vou lhe falar agora: eu bem acho que o rancor é coisa da razão, contudo, percebi que tu o adotaste; fez dele sua filosofia de vida e acabou te machucando demais. E o que há contigo? Está dormente? Não sente mais nada? Não percebe que está ferido por demais, que precisa estancar este sangue, pois está perdendo pouco a pouco os sentidos sentimentos? Ah, meu pequeno coração, não faça assim. Shi, shi, sem choro, não precisa disso, não são acusações. Eu entendo, eu entendo, eles te machucaram demais, fizeram de ti tudo o que desejaram e tu por um bom tempo fez de conta que não viu; eu entendo e lhe dou a razão, mas veja quem mais está sofrendo com isso? Hum? E então? Poxa vida, tu está te corroendo, te destruindo pouco a pouco.
Vamos fazer um acordo? Se tu conseguir abandonar esse vício, se tu aprender a perdoar e mandar esse rancor covarde embora eu volto a acreditar cegamente em ti, prometo. Eu te escuto, não te questiono, não faço mais observações banhadas de razão e pessimismo; passo a acreditar no amor, me arrumo para esperar novamente um príncipe encantado. Se tu trocá-lo, coração, eu volto a ser impulsiva, eu paro de pensar demais, faço todas as tuas vontades, me entrego a ti. Não me julgue mal, querido, por tudo nessa vida pagamos um preço, e o do rancor está alto demais para mim.

Nenhum comentário:

Postar um comentário